Por: AliMENTE para Alimentos na Palma da Mão

Recentemente foi publicado um artigo científico, mais especificamente uma revisão narrativa, que sugere que uma grande ingestão de frutose seja uma das possíveis causas do desenvolvimento da Doença de Alzheimer. Entretanto, a interpretação desse artigo pode levar o leitor a conclusões errôneas acerca do consumo de alimentos que contém frutose, então vamos ajudar a entender o recado dos autores.

Primeiramente, você sabe o que é a Doença de Alzheimer ?

A doença de Alzheimer (DA) é uma forma comum de demência que afeta a função cognitiva e a memória de uma pessoa. Caracteriza-se por ser uma doença neurodegenerativa devastadora que afeta atualmente milhões de pessoas em todo o mundo. Apesar de décadas de pesquisa, as causas subjacentes da DA ainda não estão claras e não há tratamentos eficazes disponíveis.

A hipótese atual aceita pela comunidade de profissionais da saúde é sobre a “cascata amilóide”; segundo essa teoria, placas de peptídeo beta-amilóide (um tipo de proteína) se acumulam no cérebro e algum produto formado imediatamente antes ou em consequência das placas beta-amilóide causaria a instalação e a progressão da demência. No artigo que trazemos, é proposta uma nova hipótese, na qual se sugere que a DA é uma má adaptação de uma via evolutiva de sobrevivência dos seres humanos mediada pelo metabolismo intracerebral de frutose e ácido úrico.

Você sabe o que é uma Revisão Narrativa?

O artigo publicado é uma revisão narrativa baseada em pesquisas experimentais em camundongos transgênicos, portanto pesquisas pré-clínicas, e em poucas pesquisas com pessoas com comorbidades como diabetes e obesidade. Esse tipo de publicação científica destaca determinados aspectos de estudos já feitos e os coloca em uma ordem lógica, mas não tem compromisso com a inclusão de todas as pesquisas feitas sobre um determinado tema. E mais: esse tipo de artigo não é capaz de confirmar a associação entre o consumo de frutose e DA, mas sim de apresentar uma opinião dos autores da revisão. Mesmo que seja uma opinião embasada, ainda é um texto opinativo.

Há outros tipos de estudos com uma base científica e nível de evidência maiores, como são as revisões sistemáticas e meta-análises, que possuem um melhor critério de escolha e exclusão de estudo para chegar a resultados mais válidos para a comunidade científica. Entretanto, o artigo publicado traz uma hipótese interessante que, com uma maior quantidade de estudos, poderia trazer à tona uma discussão muito válida.

Além disso, o artigo aborda tanto o consumo alimentar quanto a produção endógena de frutose no cérebro. Os autores argumentam que o consumo excessivo de frutose na dieta pode levar a níveis elevados de ácido úrico no cérebro, que por sua vez pode levar a danos oxidativos e inflamação, contribuindo para o desenvolvimento da DA, mas também aponta que há produção endógena de frutose no cérebro, que pode ser uma fonte adicional de frutose e assim contribuir  para o metabolismo intracerebral de frutose e ácido úrico. 

Vamos entender melhor o que é a frutose?

Esse nome pode não parecer estranho uma vez que é parecido com o nome “fruta”, e de fato, há frutose nas frutas que comemos e DEVEMOS comer todos os dias. A frutose é um carboidrato simples presente em diversos alimentos como frutas, sucos de frutas, bebidas açucaradas, xaropes e adoçantes, alimentos processados etc. 

Já é comprovado pela ciência que alimentos processados com frutose adicionada, quando consumidos em excesso, podem causar doenças crônicas como diabetes mellitus do tipo 2, doenças cardiovasculares, hipertensão, obesidade e, possivelmente, podem contribuir para a DA.

É importante lembrar que o organismo humano, de maneira natural, produz frutose a partir da metabolização da glicose pelo fígado e essa frutose pode ser usada como fonte de energia pelo organismo ou ser armazenada na forma de glicose no fígado. Ainda, que a produção de frutose em excesso pelo organismo também pode ocorrer em doenças crônicas, como diabetes e obesidade. 

Mas e agora? Devemos parar de comer frutas para não ter DA?

A resposta para essa pergunta é NÃO! O consumo de frutas é necessário e deve ser incentivado. As frutas são ricas em fibras, vitaminas e compostos bioativos. As fibras auxiliam no funcionamento intestinal e formação da nossa microbiota, as vitaminas são essenciais para a nossa saúde e os compostos bioativos, como os polifenóis, apresentam comprovação científica de efeitos benéficos como protetores celulares e aumento da capacidade antioxidante. 

Então o que podemos concluir?

Não se pode descartar a possibilidade de que, de alguma forma, a frutose esteja sim relacionada com o surgimento da DA, entretanto, mais estudos são necessários para comprovar essa hipótese. No momento, a hipótese mais aceita pela comunidade médica é a da cascata amiloide e provavelmente a que melhor explica como acontece a DA no organismo humano. Outro ponto já cientificamente comprovado é o malefício causado pelo consumo excessivo de frutose, especialmente na forma de açúcar adicionado em alimentos processados como os refrigerantes, sucos adoçados, bebidas esportivas e energéticas, biscoitos, cereais matinais, produtos enlatados e etc. Sendo assim, não devemos deixar de consumir frutas, sucos e outros alimentos in natura e minimamente processados que contém frutose, já que os mesmos são, também, comprovadamente benéficos para o organismo humano.

Referências:

Barreiros RC, Bossolan G, Trindade CEP. Frutose em humanos: efeitos metabólicos, utilização clínica e erros inatos associados. Revista de Nutrição, 18(3): 377–389, 2005. Disponível em: <https://www.scielo.br/j/rn/a/k8gYd6VxPqr5Bm5JWKNYpdq/?lang=pt&format=html>. Acesso em: 30 mar. 2023.

Cardoso JF, Jackix EA, Pietro L. O papel dos polifenóis na Doença de Alzheimer: revisão sistemática. Journal of the Health Sciences Institute, 34(4); 240-245, 2016. Disponível em: <https://repositorio.unip.br/wp-content/uploads/2020/12/V34_n4_2016_p240a245.pdf>. Acesso em: 29 mar. 2023.

FRUTOSE e doenças cardiometabólicas. [S. l.], 2019. Disponível em: http://biotecnutri.sites.uff.br/frutose-e-doencas-cardiometabolicas/ . Acesso em: 31 mar. 2023.

Hannou SA et al. Fructose metabolism and metabolic disease. The Journal of clinical investigation, 128,2: 545-555, 2018. doi:10.1172/JCI96702. Disponível em: <https://www.jci.org/articles/view/96702>. Acesso em: 29 mar. 2023. 

Johnson RJ et al. Could Alzheimer’s disease be a maladaptation of an evolutionary survival pathway mediated by intracerebral fructose and uric acid metabolism? The American journal of clinical nutrition, 117(3): 455-466, 2023. doi:10.1016/j.ajcnut.2023.01.002 Disponível em: <https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/36774227/>. Acesso em: 09 mar. 2023.

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