Entrevistado: Diomar Augusto de Quadros – professor titular da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Setor Litoral, Matinhos (PR), no curso de Tecnologia em Agroecologia e Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Territorial Sustentável

O nutricionista e professor da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Setor Litoral, em Matinhos (PR), Diomar Augusto de Quadros, estuda questões relacionadas à qualidade dos alimentos como forma de promover soberania e segurança alimentar e nutricional. No curso de Tecnologia em Agroecologia, de nível superior e com duração de três anos, ele conta que aborda, com os futuros tecnólogos, diferentes temas relacionados à alimentação – incluindo o aproveitamento integral dos alimentos, cultura alimentar, alimentação caiçara, e plantas alimentícias não-convencionais, as PANCs. Nesta entrevista ao “Alimentos na Palma da Mão”, ele fala da importância nutricional e ambiental do consumo de hortaliças, frutas e legumes de base agroecológica e também do aproveitamento integral dos alimentos. Defende que os nutricionistas tenham uma visão mais sistêmica sobre hortifrútis – observando de onde eles vieram e de que forma foram cultivados. Veja a seguir os principais trechos.

ALIMENTOS NA PALMA DA MÃO – Como aliar nutrição com agroecologia?

DIOMAR AUGUSTO DE QUADROS – Bem, vamos pensar primeiro na definição de segurança alimentar e nutricional, que é a realização do direito de todos ao acesso regular e permanente a alimentos de qualidade e em quantidade suficiente, sem comprometer o acesso a outras necessidades essenciais e tendo como base práticas alimentares promotoras de saúde. E não só isso. Deve-se ter respeito à diversidade cultural, econômica e social, e os alimentos devem ser produzidos de forma sustentável. Na agricultura convencional, de larga escala e com pouca variedade, isso é difícil de ocorrer, pois nem sempre as questões relativas à sustentabilidade ambiental são observadas. Se um alimento foi produzido com muito agrotóxico, por exemplo, já não pode ser sinônimo de saúde, apesar de, nutricionalmente, apresentar os macronutrientes dos quais o corpo precisa. É importante que as pessoas observem qual a procedência desses alimentos, como eles foram cultivados. Ou seja, a nutrição de fato envolve a agroecologia nesse sentido mais amplo, pois a agroecologia promove a diversidade do cultivo de alimentos, sem o uso de agrotóxicos ou adubos químicos, com respeito ao meio ambiente e à produção local. Lógico, porém, que, num país como Brasil, em que existem muitas pessoas com dificuldade de acesso aos alimentos, recomendo, caso não seja possível só consumir orgânicos, o consumo de frutas, legumes e hortaliças convencionais, que é melhor do que não consumir nada. Ainda neste caso, defendo que o consumidor consiga, na medida do possível, ter acesso ao produtor, para saber como ele produz aqueles vegetais – se segue a legislação ligada à aplicação de agrotóxicos, por exemplo.

ALM – Então, na sua opinião, segurança alimentar também tem a ver com agroecologia?

DAQ – Sim. Na minha opinião, uma excelente forma de promovermos, de fato, a segurança alimentar e nutricional é com a agroecologia. Nutrição, segurança alimentar e agroecologia têm tudo a ver. Até mesmo no Guia Alimentar para a População Brasileira há incentivo ao uso de alimentos de base agroecológica, sistema que vai além do alimento orgânico. Todo alimento agroecológico é orgânico, mas nem todo alimento orgânico é agroecológico. Isso porque muitas vezes o cultivo de alimentos orgânicos (e não agroecológicos) é realizado simplesmente dentro de uma lógica de mercado, de produção em larga escala, como a monocultura, deixando de lado a biodiversidade da produção de diversos alimentos no mesmo espaço – que, em última instância, interfere na qualidade dos alimentos e na saúde humana.

ALM – Muitos nutricionistas defendem o aproveitamento integral dos alimentos – como cascas e talos. É correto imaginar que com alimentos agroecológicos essa prática é altamente recomendável?

DAQ – Claro. Uma vez que não há agrotóxicos no sistema produtivo, frutas, verduras e legumes podem ser aproveitados integralmente – desde as cascas até talos e, dependendo do caso, sementes. Em vários casos, essas alternativas são mais nutritivas do que a parte “principal” do vegetal. A tendência de aproveitar integralmente os alimentos é crescente, mas, novamente, não se questiona a procedência do alimento, a forma como ele foi cultivado. Se foi de maneira convencional, o risco de haver resíduos de agrotóxicos na casca, por exemplo, existe, por mais que se utilizem práticas para minimizar esses resíduos. Devemos lembrar ainda que, na agroecologia, o “aproveitamento integral dos alimentos” não ocorre apenas na alimentação humana, mas também no sistema produtivo. Partes dos vegetais que efetivamente não puderam ser aproveitadas podem retornar ao solo como adubo, após passarem pelo processo de compostagem. Ou seja, continuam 100% aproveitados.

APM – Que recomendações você faria para o aproveitamento integral de alimentos agroecológicos?

DAQ – Muito além da questão nutricional, é importante também dar preferência para alimentos que sejam da época, ou seja, que estejam sendo produzidos conforme seu ciclo natural. Além disso, alimentos que sejam produzidos localmente, a fim de fortalecer a agricultura familiar e a economia local, pois, assim, o dinheiro fica na própria região, evitando-se, ainda, o uso de combustível fóssil.

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